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domingo, 20 de novembro de 2011

Do ´Prólogo` à obra «O Rei Dos Reis» - Philip Yordan

                                                                     POMPEU


                                                                  MITRÍADES VI








No ano que posteriormente se designaria por 67 a. C. , o cônsul romano Cneus Pompeius, vulgo Pompeu, foi incumbido de varrer do Mar Mediterrâneo os piratas que o assolavam e cujas rapinas haviam feito subir vertiginosamente, em Roma, o preço dos cereais. Ao fim de quarenta dias Pompeu livrou dos piratas aquele mar, mas não se contentou com vitória tão fácil. As aclamações que essa simples façanha lhe valeu em Roma inflamaram-lhe a ambição política. Apoiado pelo seu grande amigo Júlio César, Pompeu lançou-se à reconquista de todas as províncias da Ásia Menor que Roma dominara e deixara perder às mãos dos Persas. Dessa maneira. o Império Romano ia estender-se a terras que jamais tinham vivido sob o signo da águia.
Também aqui Pompeu se mostrou invencível. O pior inimigo que Roma possuía naquela parte do mundo, o rei Mitridates VI, foi estrondosamente derrotado e repelido para a Crimeia. Em 64 a. C. a Síria tornava-se província romana e um ano depois o fogoso cônsul cingia Jerusalém, a Cidade Santa da Judeia, com um anel de ferro.
A Judeia resistiu mais encarniçadamente do que qualquer dos outros objetivos da grande onda de conquista desencadeada por Pompeu. As legiões romanas cercaram a cidade murada durante três meses; vezes sem conto viram repelidos os seus ferozes ataques e as suas fileiras dizimadas pelos Judeus, na defesa amarga e heroica da Cidade Santa. Mas acabou por suceder o inevitável: abrindo largas brechas nas muralhas, as tropas invasoras irromperam através delas, numa torrente irresistível, e a cidade caiu em seu poder.

Pompeu encontrava-se na vanguarda das legiões vitoriosas que penetraram aos magotes na praça do Templo de Jerusalém. A indiferença do cônsul para com a própria segurança era fruto da sua raiva contra a desesperada resistência dos Judeus - imprevista para os Romanos - como das lendas que corriam sobre os grandes tesouros ocultos no Santo dos Santos do Templo. No seu grande corcel negro, o famoso cabo de guerra fez, desdenhosamente, com que os cascos do animal pisassem os cadáveres dos defensores e, sempre montado, subiu os largos degraus do Templo, atravessou o Salão dos Pagãos, o Salão das Mulheres, o Salão dos Sacerdotes, passou pelo altar dos sacrifícios e chegou até às portas fechadas do santuário interno, o Santo dos Santos.
As poucas mulheres que restavam com vida e o punhado de sacerdotes que tinham sido poupados olhavam com horror, enquanto o romano fazia parar o animal e contemplava as portas que davam acesso ao santuário. Atravessando a cavalo os salões externos, Pompeu profanara o Templo como nenhum outro antes dele o fizera. Atrever-se-ia agora à injúria final, invadindo o Santo dos Santos, que só os sacerdotes mais venerandos e sábios tinham pisado até então? Sim. Pompeu era capaz disso, porque era capaz de muito mais. Arriscar-se-ia mesmo a provocar a cólera de qualquer deus para chegar aos montões de diamantes e rubis e às estátuas de ouro maciço que, segundo lhe tinham dito, estavam escondidos no Santo dos Santos. O cônsul saltou da sela, fazendo tinir a armadura e seguiu na direção daquelas portas hostis.

Ouviu-se um gemido, e uns doze sacerdotes, na maioria idosos e decrépitos, agruparam-se no caminho de Pompeu, barrando-lhe a passagem. O cônsul, com a boca franzida por um gélido sorriso, contemplou durante um momento e deu uma ordem incisiva. Alguns dos soldados arremessaram as azagaias, outros avançaram com as espadas largas e curtas, os gládios. O caminho para o Santo dos Santos estava aberto!

E assim Cneus Pompeius, o homem que deveria tombar anos mais tarde às mãos traiçoeiras de um dos sues próprios centuriões, derrotado, desonrado e fugindo dos seus antigos fieis amigos - que depois se voltaram contra ele - foi o primeiro pagão a entrar no Santo dos Santos do grande Templo de Jerusalém. Não encontrou ouro algum, nem diamantes, nem rubis: em vez dessas riquezas, seus olhos depararam com um salão de piso de pedra, na extremidade do qual se via estendido um simples véu de seda.

No primeiro choque de desapontamento, Pompeu praguejou; depois atravessando o aposento com um sorriso metálico, estendeu a espada, rasgou o véu e derrubou-o. O tesouro devia estar, sem dúvida, atrás desse pano.
Mais uma vez, porém, não havia tesouro algum, nem pedras preciosas, nem ídolos de ouro incrustados de gemas riquíssimas. Apenas um altar sem adornos, e sobre ele um pergaminho com inscrições hebraicas.

O conquistador romano ficou de pé, uns instantes, refletindo no rosto aquilino uma profunda deceção; depois, com outra praga, saiu do santuário, segurando numa das mãos de grossos dedos o tesouro dos Judeus, que supusera valer um milão de talentos ou mais, uma riqueza incalculável, e que, afinal, não passava de um simples pergaminho.

Os ajudantes de Pompeu notaram-lhe a expressão de ira no rosto moreno, mas não fizeram perguntas E quando ele abandonou o Templo em largas passadas, derrotado na própria  hora do seu triunfo, com todo o orgulho destruído pela ambição lograda, seguiram-no em silêncio.

Lá fora, na escadaria, um judeu idoso e curvado que milagrosamente escapara às lanças e aos gládios, acocorou-se e estendeu a mão ossuda. Cego pela ira e pela desilusão, sem saber exatamente o que fazia, Pompeu atirou-lhe com o pergaminho e continuou. 

O maior tesouro da Cidade Santa, a Torá ou Lei de Moisés, foi, desta forma, devolvido aos judeus, e tal facto serviu para lhes minorar a mágoa da servidão nos cinquenta anos seguintes em que Jerusalém e a Judeia sofreram o jugo romano.


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