quarta-feira, 12 de novembro de 2008

«OCASIONÁLIA» - 'Do Estatuto Ontológico da mulher'




Num texto notável, incluído num livro com o título «Histoire et Vérité», intitulado «Le Socius et le Prochain», Paul Ricoeur aborda uma problemática atualíssima: devemos encarar os outros como cidadãos, como indivíduos, portadores de B.I., etc., ou mais como Pessoas?! O 'Outro' é o cidadão, o Sócio de uma sociedade ou o Próximo? Aquele cujo estatuto não pode ser definido pelo Estado, nem pela política, pois que como Pessoa transcende esse nível de horizontalidade e ingressa por estatuto Ontológico, no nível da dimensão Vertical, daquela que não ocupando espaço na base em que assenta, como a linha vertical, contudo se eleva até ao infinito!...

Nos versículos consagrados ao pecado lemos, no Livro do Génesis, que a serpente se dirige diretamente à mulher; não se dirige ao homem; dirige-se primeiro à mulher, porque a mulher está (é) mais próxima da vida, e mais imediata; no seu caminho o mal encontra a mulher antes de encontrar o homem. O homem é aqui o ser mais abstrato; é o homem que é seduzido por intermédio (mediação) da mulher. A mulher está (é) no segredo do Ser.

«A mulher está perto, junto de mim, e, contudo, não a conheço. Esta distância infinitesimal implica simultaneamente, estranheza absoluta, afastamento de uma 'Ipsidade' radical e totalmente diferente ('Ganz Andere'), possuindo um cerne diferente, um outro elemento nuclear, e, a proximidade absoluta. A mulher é-me mais próxima do que eu a mim próprio; por outro lado amo-a com um amor precário, contestado, posto em causa, pela liberdade imprevisível que a mulher incarna, essa liberdade que me indica o bater do meu coração, quando sinto a minha felicidade e vida em risco, em provação, uma liberdade que pode recusar-se-me, uma liberdade que tem de se merecer, que tem de ser demandada, que preciso de conquistar e, de seguida reconquistar, pois se perde facilmente. A mulher é por conseguinte longínqua e próxima!... Não pode confundir-se necessidade da mulher com amor. A necessidade não pode alicerçar uma relação. Até o amor se torna suspeito se sinto necessidade de o ter. Aquele que apenas sente necessidade do outro não conheceu o amor.» (Vladimir  Jankélévitch , em: «L'Autre dans la Conscience Juive» -´Le Sacré  et le Couple`, P.U.F.).



«A essencial capacidade humana de 'Entrar em si mesmo' (o ´Ensimesmamento`), tende no homem a ser um 'Ato', porém na mulher tem um carácter mais habitual, estável e seguro: 'Estar em si mesma'. O que no homem é mais um ato vetorial, na mulher é uma instalação, por isso mesmo menos percetível. A mulher pode estar em si própria -em decisivo, ensimesmada- enquanto faz inúmeras coisas, sobretudo as que afetam a vida quotidiana, sem que isso perturbe a sua estabilidade, o seu repouso interior» («A Intra-história, Domínio da Mulher», in Júlian Marías - «La mujer y su sombra»


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